Fernanda Silveira Bueno é referência na Fungicultura nacional, com vasta experiência no ramo e anos de entrega ao mundo dos fungos. Dedicada a expandir a cultura de cogumelos no Brasil, ela contou pra gente um pouco da sua vida e carreira profissional. Casada com João Lacerda há 15 anos, mãe de dois meninos, Gabriel (10) e Guilherme (8), ela é com certeza uma mulher multitarefas. Conversando com ela percebe-se logo que sucesso acadêmico pode andar junto com doçura e que pra se ter sabedoria só trilhando seus passos com simplicidade. Fernanda é uma pessoa admirável, dessas pra fazer diferença no mundo mesmo.
Seu currículo é extenso, bota história nessa caminhada e recheia tudo com determinação e
coragem. Com sede de conhecimento inesgotável, sempre foi aluna, e agora mestre, dedicada. Em meio à correria incessante, na reta final dos preparativos para os Simpósios (que acontecerão na primeira semana de Outubro), ela nos concedeu essa entrevista.
Primeira faculdade a cursar foi Administração e marketing, mas decidiu trancar este curso e foi desbravar outros mares. Atravessou o oceano e foi para Austrália, onde se formou em
Permacultura com o próprio Bill Mollinson. Ficou lá por um ano e decidiu voltar para o Brasil,
onde se formou em Agronomia pela UNITAU. Durante a graduação foi Orientada do Prof.
Augusto Eira no Projeto Temático FAPESP sobre Fungicultura, realizando o primeiro estudo
sobre doenças de shiitake do país.
Iniciou o mestrado na UNESP de Botucatu no controle de pragas de cogumelos e posteriormente migrou para Biotecnologia da USP.
Em 2004, apresentou seu trabalho sobre controle de doenças do cogumelo shiitake no
Congresso Mundial de Cogumelos, Mushroom Science em Miami.
Foi convidada pelos produtores da região de Alto Tietê e Mogi das Cruzes para representar a
cadeia produtiva de cogumelos num convênio do Sindicato Rural com a Casa da Agricultura de Mogi das Cruzes, o governo do estado de São Paulo, os produtores e o SEBRAE chamado SAI (Sistema Agroindustrial Integrado), que busca desenvolver a cadeia produtiva de cogumelo em todos os âmbitos, tanto na área técnica quanto mercadológica. Nesse convênio trabalhou aproximadamente com 250 produtores como técnica responsável pela Cadeia Produtiva de cogumelos em toda região de Mogi das Cruzes e municípios do Alto Tietê.
Realizou o Mestrado em biotecnologia na USP sob orientação do Dr. Mark Wach, vice
presidente de projeto científicos da Sylvan America Inc. Trabalhando em variabilidade genética de linhagens de Agaricus em geral produzidos no Brasil. Esse trabalho obteve grande contribuição científica na Fungicultura Mundial, uma vez que identificou no Brasil um individuo proveniente de uma Matriz produzida na China, que confirmou o estudo de melhoramento genético realizada pelo Dr Wang do Instituto de Pesquisa em Fungicultura de Fujian, China. Esse experimento foi apresentado no Congresso Mundial de Fungicultura da Mushroom Science em Cape Town na Africa em 2008.
Contratada pela Sylvan como Representante técnica e comercial no Brasil em 2007, quando
conseguiu internalizar o primeiro Container de micélio da empresa, após 10 anos de tentativas sem sucesso pela empresa.
Por volta do ano de 2011 iniciou uma grande planta de produção de shiitake orgânico e
substrato axênico em Suzano com um sistema sustentável.
Foi para a China em 2015 aprimorar a técnica de JUNCAO de produção de cogumelos,
utilizando gramíneas como matéria prima.
Faz parte da rede Sul Americana de fungos como pesquisadora, representando o Brasil.
Em 2016 foi pra Holanda no congresso mundial apresentar seu trabalho sobre evolução
econômica na Fungicultura no Brasil.
Professora Pesquisadora da Fatec de Mogi das Cruzes e Jacareí. Em 2017 iniciou um projeto
como professora pesquisadora da Fatec juntamente com o Centro Paula Souza de horta e
fungicultura nas escolas públicas, ensinando primeiramente a produzir e consumir cogumelos, quebrando o preconceito com os cogumelos na alimentação e incentivando o hábito saudável.
Ensina o cultivo de hortaliças e o consumo de cogumelos como fonte de proteínas, além de
gerar oportunidades no futuro formando mais profissionais especializados na área. Idealiza a
construção de viveiros nas escolas em parceria com a Cogumelos Brazilis, que realiza doação de substrato para o projeto.
Iniciou no último ano uma planta de produção de substratos esterilizados de cogumelos em
Pindamonhangaba com seu marido João Lacerda, utilizando manejo sustentável e orgânico. No local realiza também cursos de capacitação em Fungicultura, Agricultura orgânica, Natural, Permacultura, Turismo Rural, Científico e Pedagógico.
Escreveu um livro juntamente com a Rede Latino Americana de fungos sobre Fungicultura no
Brasil. Coordenou juntamente com seu Mestre Dr Augusto Ferreira da Eira dois vídeo Cursos
sobre Produção de Shiitake e Pleurotus pelo Centro de Produções Tecnológicas, CPT.
E agora coordenadora do Simpósio Internacional , Fernanda nos concedeu essa entrevista em meio a tantas solicitações da sua agenda, pedidos, entregas, prazos. Contou, sorriu e ensinou como se lhe sobrasse tempo. Sim! O mundo precisa de mais Fernandas.
Fungo Shop: Qual objetivo do simpósio?
Fernanda: Os Simpósios Internacional e Nacional sobre cogumelos comestíveis objetiva o intercâmbio científico, tecnológico e cultural entre as cadeias produtivas relacionadas aos cogumelos comestíveis e medicinais com a finalidade de auxílio no desenvolvimento de novas tecnologias,na expansão da produção nacional, registros e comercialização de cogumelos no Brasil. Participação de profissionais e pesquisadores reconhecidos internacionalmente, os quais ministrarão palestras e também minicursos de interesse da fungicultura. O I Encontro de Biotecnologia de Alimentos do instituto de Ciência e Tecnologia da UNIFESP tem por objetivo fomentar a discussão sobre alimentos funcionais, probióticos, nutrigenómica, formulação de bioinoculantes, produção de alimentos e seu consumo integral, evitando o desperdício e geração de resíduos ressaltando desta forma, os benefícios para saúde e ambiente.
Fungo Shop: Quais países são lideres mundiais em tecnologia e aprimoramento das técnicas de cultivo? Estamos muito distantes?
Fernanda: A china é o maior produtor de cogumelos do mundo, mas isso se deve a alguns fatores primordiais como a necessidade de produzir alimento para sua população que é muito grande, com um produto que produza rápido e que use pouco insumo. A China possui tanto o rústico como tecnologia de ponta na produção.Em termos de produtividade por metro quadrado a Holanda, EUA tem uma produtividade grande, Itália e México também aumentaram sua produção nos últimos anos. Mas veja a Holanda como exemplo, é um país muito pequeno, a produtividade deles depende deles serem muito bons em tudo que fazem, pois ele precisam produzirem pequenos espaços de terra, com uma condição ambiental muito drástica. Isso estamos falando em termo de tecnologia e conhecimento, mas enquanto conhecimento e tecnologia pro Brasil eu acredito realmente que precisamos sim melhorar a produtividade, melhorar o conhecimento, mas dentro da nossa realidade porque não da pra falar para produtores brasileiros usarem a máquina da Holanda em sua produção, mas sim adaptar essas tecnologias para a nossa realidade, dentro das condições brasileiras. É muito interessante também pensar em tecnologias como construção alternativa, como galpões com pé direito alto, aberturas estratégicas,materiais reflexivos que possuem um custo super baixo e funciona muito bem. Isso também é conhecimento, também é tecnologia.A Fungicultura no Brasil ainda é um bebê que precisa de muito conhecimento para crescer, mas esse crescimento precisa do fomento dos maiores interessados, que são os produtores. Se eles querem evoluir eles precisam investir em conhecimento,investir em quem pode trazer esse conhecimento. Falta no Brasil, essa união das pessoas investindo, tirando um pouco do seu bolso para investir para o crescimento da Fungicultura. Um dos principais locais para se investir são as Universidades e Centros de Educação. Nos Estados Unidos é uma prática comum o investimento de iniciativa privada em universidades e centros de pesquisa. Nossa pesquisa não cresce por que falta demanda do setor produtivo. Devido à falta de demanda e até investimento do setor produtivo nas instituições de ensino, as Empresas Governamentais de fomento que financiam as pesquisas investem em outros setores porque não possuem incentivo, demanda da Cadeia Produtiva de Cogumelos para investir na Fungicultura. Nossos produtores não estão organizados e pouco apoiam as organizações existentes. Quem faz pesquisa no Brasil são sobreviventes, são amantes que fazem milagre,viramos noites, escrevemos projetos em prol do crescimento da cadeia produtiva. O que falta aqui é esse link entre o maior interessado com quem pode ajudar ele acrescer. Isso é o que falta! O Brasil precisa criar tecnologia para realidade brasileira,temos que parar de importar essa tecnologia que são muito mais caras e muitas vezes ficam obsoletas. Muitas produções que investiram muito e perderam ficam muitas vezes com todo esse maquinário parado, sem ter o que fazer depois disso. Mas sim, o brasileiro precisa investir em crescimento e tecnologia, mas que seja adequado para nossa necessidade, pra nossa realidade!
Fungo Shop: O que te motivou a aceitar a organização desse Simpósio?
Fernanda: Uma das coisas que me motivou foi com certeza o crescimento da fungicultura nacional! E quando a Sylvan, que é a maior patrocinadora do congresso mundial de cogumelos, me procurou com o interesse de fazer o próximo evento no Brasil, eu aceitei rapidamente esse desafio de coordenar o simpósio, com o intuito de poder incrementar ainda mais o nível de conhecimento da fungicultura brasileira, fornecendo o máximo de informação para que a cadeia produtiva possa evoluir ainda mais. Será como um preparatório para o congresso mundial, onde o nível técnico é altíssimo. Outra coisa que me motivou é que o ano passado eu fui para Holanda para Congresso Mundial apresentar um trabalho e foi falado que os grupos de pesquisa de cogumelo,no mundo todo, estão sendo reduzidos, e isso é muito complicado! Precisamos nos unir, precisamos ter uma força tarefa nos países para que a fungicultura não morra. Ao mesmo tempo em que o mundo esta passando por um momento de necessidade de cultivo de proteína de alto valor biológico para suprir a fome em vários países e também a necessidade de trabalhar com fontes de proteína menos impactantes para o meio ambiente do que a carne, por exemplo. Então para o planeta a fungicultura é muito positiva e nós temos o dever de estimular isso o máximo que a gente puder! O simpósio é a ferramenta mais importante que nós temos no Brasil hoje para promover o incremento de produtividade, para os produtores aprenderem técnicas e terem conhecimento que possa aumentar a produtividade do seu cultivo. É uma ferramenta que tem uma troca entre os produtores e traz um conhecimento de pessoas que estão no ramos a 30, 40 anos… é uma oportunidade que o produtor brasileiro tem de ter contato com essas pessoas, oportunidade de crescer, evoluir, e então a cadeia produtiva de maneira geral crescer e evoluir também.
“o cultivo de cogumelo é produção de proteína de baixo impacto para o meio ambiente”
Fungo Shop: Quando começou seu contato com a fungicultura?
Fernanda: Comecei meu contato com a fungicultura em 96, na Austrália, onde eu conheci alguns cultivos.Quando voltei para o Brasil conheci meu grande companheiro João, que decidiu investir em meu sonho e iniciamos a produção de cogumelos em Pindamonhangaba. Então, logo depois eu comecei a estudar com o professor Augusto Eira, ele me convidou para participar do Primeiro Projeto Temático de Cogumelos. A minha pesquisa foi o primeiro estudo sobre doenças de cogumelos do Brasil e foi esse trabalho que eu apresentei no Congresso Mundial de Cogumelos em Miami, em 2004. Na ocasião eu tive a oportunidade de fazer meu mestrado lá(EUA), mas eu preferi fazer aqui no Brasil por algumas razões, dentre elas é que aqui eu conseguiria fazer uma maior diferença pra fungicultura e foi muito importante essa decisão,porque eu trabalhei tudo dentro da realidade brasileira.
Fungo Shop: Fernanda, qual mensagem você gostaria de deixar aqui para todos nossos amigos da FungoShop?
Fernanda: Que eu tenho muita gratidão a todos que ajudaram na realização desse simpósio. Foi um ano muito difícil para o Brasil, não só de maneira econômica, mas também política e devido a isso muitas das empresas internacionais que viriam para o simpósio cancelaram sua presença, oque acarretou grande prejuízo, dificultando ainda mais nossa realização. A decisão que tive que tomar juntamente com a Prof. Elisa Espósito de continuar ou desistir do Simpósio devido às circunstâncias atuais e totalmente sem apoio financeiro das Agências Governamentais de fomento foi muito difícil. Mas graças a Deus, ao apoio incondicional de nossas famílias, a grande motivação foi o apoio e a união primeiramente das instituições: Fatec de Mogi das Cruzes, UNIFESP e Embrapa, representadas por mim e pelas Professoras Elisa Espósito e Arailde Urben juntamente com suas equipes não mediram esforços para esse grande Feito! A União e o apoio de empresas como a Fungo Shop representado pelo Marcelo e Eli Ramos, produtores de Mogi das cruzes, Gildo, Sitio Paizinho e CG Compostagem , Labfungi, Convention Bureau de São José dos Campos, toda equipe da Unifesp do laboratório da Dra. Elisa Espósito, a equipe da Fatec deMogi das Cruzes, Sindicato Rural de Mogi das Cruzes, FAESP e SENAR de Mogi das Cruzes, Agenzia, Daniel Gomes da APTA, Sr Neudes da Simp, Unicorn bags, Associação Nacional de Produtores de Cogumelos, Comtur São José dos Campos, Colpobras, C4, Blue, que contribuíram financeiramente para a realização do Simpósio. Na comissão científica composta os Professores Dr Daniel Royse, Dra Elisa Espósito, Dra.Neusa Haruka, Dra Valdite Fugaz, Dra Mariangela foram maravilhosos para garantir a qualidade científica do Simpósio. Uma pessoa que foi ímpar em nos ajudar e nos apoiar em todos os sentidos foi a Dra. Arailde Urben, da EMPRABA, ela foi simplesmente maravilhosa, nos apoiou nos momentos mais difíceis, conseguiu patrocínio, publicação Embrapa, imensa gratidão a ela! Não posso esquecer jamais dos professores Daniel Royse, Mark Wach e Jonh Peck por terem concordado em ministrar esses mini cursos de seis horas, além das palestras de 30 minutos. Finalmente agradeço a Deus e grandes nomes da Fungicutura Mundial como Dr Augusto Eira que deram a vida pelo desenvolvimento da Fungicultura e graças ao seu trabalho maravilhoso permitiu que hoje esse Simpósio existisse através de seus alunos que hoje são os Professores e pesquisadores que permitem a continuidade da Fungicultura Nacional!Esse evento será uma contribuição grandiosa para os produtores, foi um feito realmente maravilhoso.
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